quarta-feira, 6 de março de 2013

E agora Hugo?

Um dia depois da morte de Hugo Chávez, este foi o texto mais impressionante que li. A carta da ex-mulher, escrita há algum tempo, num misto de sinceridade e desabafo cheio de raiva.
Ainda não consigo dar uma opinião sobre estas palavras. São demasiado fortes e frias. Mas se vêm do coração, porque não serão justas de alguma forma? As verdades também têm de ser ditas. E só porque a morte se aproxima, nada apaga o passado.
Mas ser lembrado assim não é algo que deseje :/





Hugo,

Algumas considerações sobre a tua morte que se aproxima:

Não quero que partas desta vida sem antes nos despedirmos, porque tens feito um mal imenso a muita gente, tens arruinado famílias inteiras, tens obrigado legiões de compatriotas a emigrar para outras terras, tens enlutado um número incontável de lares, aos que achavas que eram teus inimigos os perseguiste sem quartel, os aprisionaste em cubículos indignos até para animais, os insultaste, os humilhaste, os enganaste, não só porque te achavas poderoso, mas também imortal... Porque o fim dos tempos não te alcançaria.

Mas a tua hora chegou, os prazos se esgotaram, o teu contrato chega ao seu fim, teu "ciclo vital" se apaga pouco a pouco e não da melhor maneira; provavelmente morrerás numa cama, rodeado de tua família, assustada, porque vais ter que prestar contas uma vez que das teu último alento, te vás desta vida cheio de angustia e de medo, lá vão estar os padres a quem perseguiste e insultaste, os representantes dessa Igreja que ultrajaste por prazer, claro que te vão dar a extrema unção e os santos óleos, não uma, mas muitas vezes, mas tu e eles sabem que não servirão para nada, mas só para acalmar o pânico a que está presa a tu alma ante o momento que tudo define.

Morres enfermo, padecendo do despejo, das complicações imunológicas, dos terríveis efeitos secundários das curas que prometeram alongar a tua vida, teus órgãos vão se deteriorando, um a um, tuas faculdades mentais vão perdendo o brilho que as caracterizava, teus líquidos e fluidos são coletados em bolsas plásticas com esse fedor de morte que tanto te repugna.

Diga-me, neste momento, antes que te apliquem uma nova injeção para acalmar as dores insuportáveis de que padeces, vale a pena que me digas que não te possam tirar a dança – ah! – as viagens pelo mundo, os maravilhosos palácios que te receberam, as paradas militares em tua honra, as limusines, os títulos honoríficos, os pisos dos hotéis cinco estrelas, as faustosas cenas de estado.


Diga-me agora que vomitas a sopa de abóbora que as enfermeiras te dão na boca, se era sobre isso que se tratava a vida, pois os
brilhos e as lantejoulas já não aparecem nos monitores e máquinas de ressuscitação que te rodeiam, as marchas e os aplausos agora são meros bipes e alarmes dos sensores que regulam teus sinais vitais que se tornam mais débeis.

Podes escutar o povo do teu país lá fora do teu quarto?... Deve ser tua imaginação ou os efeitos da morfina, não estás na tua pátria, estás em outro lado, muito distante, entre gente que não conheces... Sim, estás morrendo em teu próprio exílio, entre um bando de moleques a quem confiou entregar teu próprio país, teus últimos momentos serão passados com vigaristas, entre a tua corte de aduladores que só te mostram afecto porque lhes davas dinheiro e poder; todos te olham preocupados e com raiva, nunca deixastes que nenhum deles pudesse ter a oportunidade de te suceder; agora os deixas ao desabrigo e teu país à beira de uma guerra civil...

Era isso o que querias? Foi essa a tua missão nesta vida?

Esqueces-te da quantidade de pobres, agora há mais pobres do que quando chegaste ao poder; esqueces-te da justiça e da igualdade quando praticamente lhe entregastes o país a uma força estrangeira que agora teremos de desalojar à força e ao custo de mais vidas.*

Tenho a leve impressão que agora sabes que te equivocaste; acreditaste num conto de passagem e te julgaste revolucionário, e por ser revolucionário... imortal; convocaste para o teu lado os mortos, teus heróis, esses fantasmas que também julgavas ter vida, Bolívar, Che Guevara, Fidel, e Marx que nunca conheceste e que recomendavas a sua leitura...

Andar com mortos te levou à magia, te meteste a violar sepulturas, e a fazer oferendas a uma corte de demónios e espíritos maus que agora te acompanham... Sentes a presença deles no quarto? Estão vindo te cobrar, recolher a única coisa que deverias valorizar em tua vida e que tão sinistramente atiraste na obscuridade e no mal, a tua alma.*

Bem, me despeço; só queria que soubesses que passarás para a história do teu país como um traidor e um covarde, por não teres rectificado tua conduta quando pudeste e te deixaste levar por tua soberba, por teus ideais equivocados, por tua ideologia sinistra renunciando aos valores mais apreciados, a tua liberdade e à liberdade dos outros, e a liberdade nos
torna mais humanos.


"O socialismo só funciona em dois lugares: no céu, onde não precisam dele, e no inferno onde é a regra dos que sofrem".



*Nancy Iriarte Díaz*


Realmente Hugo, poderias ter feito melhor. E agora?

9 comentários:

  1. Caramba! Palavras fortes e duras que mostram a quem ainda tinha dúvidas, do carácter do Hugo.

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  2. São palavras de alguém que sofreu muito...

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  3. Querida Vânia, eu não acredito nestas palavras... desculpa mas é verdade!
    Um país que tinha um IDH baixíssimo e que em 10 anos, subiu imensas posições, não pode ter tido um líder tão desprezível, quanto estas palavras levam a crer...
    Beijinhos grandes.

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    1. Entendo-te sim, e por isso achei impressionante sem conseguir ter uma opinião formada. Claro que fez muito pela Venezuela, mas a carta vem de quem foi íntimo dele, de quem partilhou uma vida e viu de perto o carácter de Hugo Chavez...

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  4. Um retrato fiel do que era este "camarada"!

    Gostei do blog e vou voltar!

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