sexta-feira, 27 de setembro de 2013

26

Ainda não passei da primeira linha e já estou com os olhos cheios de lágrimas.
O dia 26 de Setembro irá sempre mexer comigo. O número 26, irá sempre mexer comigo.
E uma mistura de tudo, de alegria e tristeza, que bem abanado, dá um simples e forte aperto no peito.
Hoje já felicitei amigos pelo respectivo casamento, já dei parabéns a dois outros amigos (e à minha querida Mente Flutuante) e a uma prima minha.
E já me lembrei do Vítor. Lembro-me sempre do Vítor e por mais anos que viva, sei que me vou lembrar.
Não era meu irmão, não era meu primo nem colega de trabalho.
Era o namorado de uma das minhas melhores amigas, o único que lhe conheci até hoje. A Alice, que conheço quase desde sempre, é enfermeira e foi-se aproximando do Vítor no Hospital (não o do trabalho dela, mas como visita - já se conheciam por amigos comuns e achou por bem ir vê-lo e acompanhá-lo).
O Vítor começou a queixar-se de dores de costas e depressa descobriu que tinha um cancro (intestinos, creio eu).
A Alice, como amiga e enfermeira, acompanhou-o e foi-se aproximando dele, cada vez mais.
O amor surgiu e apesar de eu a entender e ficar feliz por ela, avisei-a que era um terreno perigoso, a situação dele era delicada e ela podia magoar-se com aquilo que a vida (ou não) lhe poderia dar com essa história.
E ela lutou. Lutou muito. Virou o mundo do avesso para o salvar e tratar.
Durante quase dois anos, as quimioterapias e as mudanças na alimentação e rotinas foram constantes.
Quantas vezes senti que a Alice queria chorar e não podia, para que ele também não desistisse.
Lembro-me como se fosse hoje, de fazermos vídeos e sketches para o Vítor se animar.
Lembro-me como se fosse hoje, da Alice me dizer em prantos, que ele era um Quimio resistente e que tinha decidido parar. O Vítor tinha desistido de se tratar, de sofrer mais.
Lembro-me como se fosse hoje, de o ir visitar a casa, com ela e mais um amigo nosso, e ver a morte à minha frente.
Lembro-me como se fosse hoje, os fins de semana em Ponte de Lima, das gargalhadas dele e da sobremesa que fez para nós, no dia dos meus anos: mousse de mirtilos.
Fazia 26 anos e disse-lhe, num simples comentário, que não gostava do nº 26. Tinha gostado dos meus 25 anos mas fazer 26 era assim...meio desconsolado. E ele disse: "Sério? Não gostas do nº 26? Porquê?"
Ironicamente...seis meses depois:

Vítor morreu a 26 de Setembro de 2008. Tinha 30 anos.
Nunca chorei tanto num velório e num funeral. Por ele e pelo sofrimento dos pais...mas pela Alice.
Naquele dia, não tive coragem de lhe dizer nada...apenas "Já viste o dia lindo que está hoje?", ao qual ela me respondeu: "Eu disse-lhe que ia estar sol neste dia".

Nunca vi tanta gente.
Nunca assisti a uns gritos sufocados de uns pais tão desorientados.
É por isso que o dia de hoje será sempre estranho.
Uma vez, há muitos anos, uma menina de 3 anos (no meu estágio final de curso) dizia que sabia como as pessoas morriam: "Apagam-se as luzinhas da cabeça".
E eu acho que foi isso que aconteceu ao Vítor.
Porque foi no céu que se acenderam :)


20 comentários:

  1. Que história Vânia... Comovente mas ao mesmo tempo arrepiante. Beijinhos e força.

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  2. Que história tão triste :(

    Um beijinho grande para a Alice*

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  3. Grande vitor... uma grande perda..
    Lembro-me bem dele e da coragem que demonstrou. Sempre com um sorriso, e até o à vontade com que ele falava sobre a sua condição. Um exemplo.

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  4. Nem sei que te diga. No início sorri pela menção à minha pessoa e ao meu aniversário, depois deixei de sorrir com a história do Vítor e depois voltei a sorrir quer com o vosso simples diálogo no funeral quer com a definição de morte que essa menina te deu. Continuo a não saber o que dizer. Acho que não vou dizer mesmo nada, já está tudo dito.
    beijinho grande

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  5. Bem... regresso a teu blog (de forma activa e participativa como era, prometo!!) e e dou de caras com isto... com esta história, que me faz lembrar tantas outras... :( Mas sabes, sempre que "vivo" e leio estas histórias, tento sempre pensar, que a vida vale a pena em cada segundo que passa, e porque raio é tão complicado e dificil para nós, viver isso de verdade? Quantas horas e pensamentos desperdiçamos de forma parva... :( de forma injusta... quando as lições parecem tão fora de lógica e fora de tudo? :(.... Porque raio nos esquecemos que a vida não são os planos que sonhamos, mas o aqui e agora??....:( O ser humano é mesmo uma coisa estranha de se entender... às vezes acredito, que mesmo imersos na raiva da injustiça da vida, as pessoas que têm de passar por algo assim é que sabem verdadeiramente o valor da vida... Tenta concentrar-te neste dia, na pessoa maravilhosa com quem tiveste a sorte de te cruzar, das palavras e sentimentos trocados!:)
    Beijo grande!!!!!!:)

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    1. Olá novamente!!!
      Sim eu sei disso e faço-o...mas a memória fica mais viva neste dia.
      Beijinhos

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  6. Obrigado por teres gostado do meu blog! Comoveste-me imenso com esta historia.. Juro que me arrepiei quando li que faleceu dia 26.. Fizeste bem em partilhar e já sabes, tenta não te lembrar desse dia para não ficares triste! Gostei imenso do teu blog, já estou a seguir <3
    http://annluckindarkdays.blogspot.pt/

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  7. Que dor de alma. Lamento imenso a perda... força.

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  8. Que m.... de vida :(
    Beijinhos para ti e que a Alice seja muito feliz (e tu também, claro!)

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  9. Que história triste, espero que o Vitor esteja a olhar pela Alice.

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  10. Há dias assim, que ficam marcados para sempre.
    Um beijinho.

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